Deus é Politicamente Incorreto


Eu ficava tentando entender quando foi que as pessoas começaram a tentar colocar Deus sentado no banco de réus acusado de ser politicamente incorreto – e mal humorado, arbitrário, caprichoso, egoísta, etc, etc.
Eu achei que era recente isso, mas a humanidade não é assim tão imprevisível.
O livro de Jó é um dos mais antigos da Bíblia, e mesmo assim apresenta questões que a maioria das pessoas levanta hoje pra questionar o Deus bíblico.
A diferença, é que, após todos os questionamentos levantados no livro, a resposta de Deus pode ser um pouco frustrante pra nossa sociedade exigente e caprichosa. Deus simplesmente vira pra Jó e pergunta: “Quem primeiro me deu alguma coisa, que eu lhe deva pagar? Tudo o que há debaixo dos céus me pertence.” (Jó  41:11)

Esse verso isolado poderia ser uma ótima desculpa pras pessoas dizerem que Ele é realmente um Deus arbitrário e não respeita nosso livre arbítrio, e por ser poderoso, faz o que quer. E provavelmente não é bom, pois não extirpa o mal da face da Terra.
Mas o livro de Jó tem um contexto.
Deus, Criador e Mantenedor da humanidade e da Terra, teve sua autoridade desafiada (e não era a primeira vez) pelo que fora um dia um dos Seus anjos.
Satanás apontou o dedo para o soberano e disse que vinha de “rodear a Terra e passear por ela”, um termo que, naquela época era usado por reis para dizer mais ou menos o seguinte: “Eu andei disfarçado pelo meu Reino para colher opiniões políticas, e não achei nenhum que não me servisse!”
A resposta de Deus pode ser reescrita da seguinte forma: “Pode ir tirando seu cavalinho da chuva! Você não viu meu servo Jó?”
“Sim, eu vi!” respondeu o traidor “Mas comprando votos é fácil! Você dá tudo pra ele! Quero ver se você parar de dar assistência, se ele continua sendo fiel! A Terra é minha!”

Esse pequeno diálogo desencadeia uma das maiores discussões filosóficas escritas de todos os tempos.
Alguns acusam a permissão que Deus deu a Satanás de destruir a vida de Jó – sem porém mata-lo – como uma aposta cruel pra ver quem ganhava a sorte.
Mas essa possibilidade simplesmente não faz sentido, afinal, se Deus “ganhasse” a aposta, o que Satanás poderia oferecer a Ele que possuía tudo?
Aí você poderia argumentar que Deus faria isso pra manter seu reino na Terra, como se precisasse ter um servo como esmola para não deixar a Terra inteira nas mãos do Inimigo. Mas essa também é uma argumentação sem fundamento, afinal, Satanás podia reclamar a Terra como dele, mas ela continuava sendo propriedade de Deus. E mesmo que a maioria dos seres humanos tenha escolhido estar do lado do Inimigo, eles só puderam fazê-lo graças ao livre arbítrio que Deus ofereceu a eles.

Mas Deus não foi muito egoísta ao permitir que seu servo sofresse para provar sua soberania?
A resposta simples e direta é não!
Ele sequer precisava provar sua soberania. O que ele estava tentando mostrar era justamente o seu amor! Amor esse que, de tão grande, abriu mão de fazer o que queria para respeitar escolhas. Foi pra provar que sua soberania não se sobrepunha à sua justiça e à liberdade que ele concedera aos seus súditos.
Mesmo que soubesse do futuro, durante todo o tempo em que Jó discutia com seus amigos sobre os argumentos que teriam para explicar a escolha divina de permitir que as bênçãos fossem tiradas dele, Deus permaneceu em silêncio.
Deus não fez absolutamente nada para garantir que Jó permanecesse seu servo. Ele permitiu que Jó escolhesse por si mesmo se permaneceria firme mesmo depois de tudo o que lhe foi tirado: os bens, a família, a saúde.
A sua mulher chegou a dizer o que muitos hoje em dia dizem para os religiosos que estão passando por perdas e dificuldades: “Amaldiçoa esse Deus seu e morre!”
Jó chegou a questionar o que teria ele feito de errado para sofrer tanto, mas não cogitou a possibilidade de questionar o caráter de Deus. O que ele ou os seus amigos não haviam percebido é que não se tratava de merecimento.

Quando finalmente aparece para Jó, Deus não responde nenhum dos questionamentos dele e de seus amigos. Ele simplesmente responde com novos questionamentos, mais importantes, mais profundos... E esses questionamentos (retóricos, aliás) de Deus para Jó declaravam a pequenez deste diante do Universo, e como o Universo em si era pequeno diante do próprio Deus.
Deus estava tentando provar sua soberania? Definitivamente não! Afinal, por que alguém tão soberano, que se preocupasse apenas em demarcar territórios se preocuparia com um minúsculo ser que perdera tudo na superfície de um grão de poeira cósmica?
A resposta de Deus para Jó foi similar à que Ele deu a Habacuque quando este questionou a situação de Israel: “O Senhor está em seu Santo Templo, cale-se diante dEle toda a Terra” (Habacuque 2:20 ). Em outras palavras: “Para de reclamar, cale a boca e confie, Deus sabe o que está fazendo!”.

Mas nós insistimos na nossa própria razão, achando que evoluímos de uma ideia arcaica e retrógrada ( a ideia de Deus) para um caminho de esclarecimento.
E então, com ares intelectuais e soberba crítica, perguntamos: “Ora, mas o livre arbítrio concedido por Deus é uma ilusão! Se você não escolhe-lo você morre!”
E quem declarou para nós, humanos, que temos mais de duas opções? Quem foi que nos garantiu o direito de criarmos tons de cinza entre o preto e o branco do bem e do mal? Desde quando somos maiores do que Deus ou o Universo para decidirmos que TEMOS que ter mais de duas opções para sermos livres?

Parece-me que alguns cristãos tem medo de entregar as respostas prontas para a nossa sociedade que superestima os questionamentos intermináveis da “Era da Razão”. Mas, como disse o rapper Lecrae em uma entrevista recente, “Os cristãos, historicamente, amam oferecer respostas ao invés de levantar grandes questões”.
Então, quando dizemos que dEle, por Ele e para Ele foram criadas todas as coisas, o questionador deste século enche o peito para questionar: “Então você quer dizer que o seu Deus que é bom e poderoso criou o mal?”
A resposta curta e grossa é sim e não! “Mas Deus não é o bem em essência? E vocês não dizem que não há nada de mal nele? Como ele pode ter criado o mal?”
Simplesmente por que o mal consiste na ausência do bem, e se o bem é Ele, o mal é definido pela ausência dEle. A pergunta certa seria: “Deus criou a maldade?” Aí minha resposta seria não.
Deus é definido pelo amor, e o amor exige que ele nos deixe livres para escolher aceitar ou não esse amor. Ao nos dar essa liberdade de escolher entre estar ou não estar com Ele, que é o bem, Ele criou o mal em potência. Ele criou seres livres e, consequentemente, com a possibilidade de escolher o mal.
O mal não existe enquanto “força”, portanto ele não pode sequer ter sido criado, mas antes de surgir no coração de Lúcifer, desde que este e todos os outros seres criados tinham surgido, o mal já existia em potência, como uma possibilidade, uma consequência da liberdade que ganhamos.

O politicamente correto do nosso pós-modernismo que insiste em dizer que luta pela tolerância ao próximo, falha miseravelmente na sua missão ao negar que possa ser um ato da bondade e da misericórdia de Deus purificar a Terra do mal.
O Dilúvio, a destruição de Sodoma e Gomorra, as guerras onde ordenava a execução de povos inteiros são coisas que os questionadores que apregoam o “politicamente correto” utilizam para argumentar a arbitrariedade do Deus bíblico, como ele é carrasco e assassino.
As pessoas enchem o peito para questionar essas coisas, como se a Bíblia assumisse qualquer outra definição de bem que não fosse o próprio Deus. Como se Deus não fosse o ÚNICO argumento para definir a existência do bem e não fosse Ele mesmo a bússola para definirmos o que é bem e o que é mal.
A Bíblia diz que Deus é misericordioso, mas também diz que ele é justo. Por ser misericordioso, ele permite que escolhamos entre a vida com Ele (o bem e a vida) e a vida sem Ele (o mal e a morte). Por ser justo ele permite que colhamos as consequências dessa escolha, que podem ser duas: o bem/vida ou o mal/morte.
Mas mesmo Deus sendo justiça, a única dessas duas coisas na qual Deus tem prazer é a misericórdia. Miquéias 7:18 : "Quem, ó Deus é semelhante a ti, que perdoas a iniquidade, e te esqueces da transgressão do restante da tua herança? O Senhor não retém a sua ira para sempre, porque tem prazer na sua misericórdia".

Deus nunca quis destruir pessoas, mas sempre quis destruir o mal, pois ele SABE que a sua ausência na humanidade é exatamente o que provoca coisas como preconceito, violência, egoísmo. Mas infelizmente, todas as vezes que Deus purifica a Terra do mal, tem muita gente agarrada neste mesmo mal – e Ele SEMPRE dá a oportunidade de escolha.

Portanto, o maior papo furado que existe é execrar o Deus bíblico e declará-lo “morto” ou “ultrapassado” simplesmente por que ele não se encaixa nos padrões que nós, humanos falhos e pecadores, estabelecemos para o que seria correto, ético e justo. Nós nos achamos no direito de questioná-lo simplesmente por que Ele, que criou o Universo, escreveu as suas regras e nos deu a escolha de seguirmos essas regras ou não, sofrendo as consequências delas.
Você pode achar o Deus de Israel separatista e "preconceituoso" (se é que se pode usar essa expressão pra definir alguém que conhece todas as pessoas profundamente) por declarar na Bíblia que não criou o ser humano para ser homossexual, por exemplo, mas nunca poderá negar o amor dele por todas as pessoas, inclusive os homossexuais – e exatamente por isso, qualquer um que tenha real temor e amor a Deus não ousará praticar qualquer ato de violência verbal ou física contra um deles.

O “politicamente incorreto” de Deus é infinitamente mais justo e coerente e cheio de amor do que qualquer das nossas tentativas de fazer da nossa sociedade algo melhor. E exatamente por isso, o único direito que ele tomou de nós foi o de julgar o que é certo e o que é errado, e consequentemente, tirou-nos também o direito de decidir quem morre e quem vive.
Diante disso, pense duas vezes antes de tentar argumentar sobre a bondade e a soberania de Deus. Satanás tentou fazê-lo, não quis admitir seu erro e, infelizmente, por causa de suas escolhas, vai acabar morto no final das contas.

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