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[CONTO] A Abominável Desolação Rubra

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 “Então, se alguém vos disser: Eis aqui o Cristo! Ou: Ei-lo ali! Não acrediteis; porque surgirão falsos cristos e falsos profetas operando grandes sinais e prodígios para enganar, se possível, os próprios eleitos.  Vede que vo-lo tenho predito. Portanto, se vos disserem: Eis que ele está no deserto!, não saiais. Ou: Ei-lo no interior da casa!, não acrediteis. Porque, assim como o relâmpago sai do oriente e se mostra até no ocidente, assim há de ser a vinda do Filho do Homem. Onde estiver o cadáver, aí se ajuntarão os abutres.” (Mateus 24:23-28) Ele não chegou sem aviso. Eu vi sua sombra chegar aos pouquinhos. O povo estava decepcionado e determinado a colocar qualquer coisa no lugar dos anos de poder da Ordem dos Feiticeiros Escarlates. Então ele se apresentou como a única saída para recuperar a dignidade da terra, ele disse que nossa terra era dominada pelo verde das matas e o amarelo do ouro da nossa riqueza, nosso brasão nunca seria vermelho e as pessoas repetiam esse coro. Ele diss

[série] Dezembro de Deus | Cap. IV - Fé cega, faca amolada

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  Novembro de 1984 Zé estava andando como de costume em direção ao trabalho. Passou em frente à escola, onde Maria, com a barriga enorme, decidiu continuar estudando até o fim do ano, já que o nenê estava previsto para dezembro. Zé apoiou a decisão, pois queria que ela realizasse seu sonho. Mas ela agora já não conseguia dar oi pra ele da janela, pois ela tinha que ficar perto da porta, pois queria fazer xixi a todo minuto. Desde o casamento, em junho, eles estavam morando na casa de Zé com a mãe e os irmãos dele, pois a casa era maior que a de dona Zilá. Mas, ou dona Zilá estava sempre na casa de Geruza, ou Maria estava na casa da mãe. Zé estava pensando nessas coisas quando de repente ouviu um tiro.

[série] Dezembro de Deus | Cap. III - Maria, Maria

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  Junho de 1984 - Eu, José Carlos de Oliveira Silva, aceito você, Maria Pereira de Souza, e agora, Silva, como minha legítima esposa e prometo te amar e te respeitar na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, por todos os dias da minha vida, até que a morte nos separe. Zé colocou a aliança fina no dedo anular de Maria com um sorriso no rosto. Ele estava ciente dos cochichos fofoqueiros das senhorinhas com olhar de desaprovação no fundo da igreja. Ele estava ciente também do quanto o pastor Arlindo estava arriscando seu próprio emprego celebrando aquele casamento, mesmo que não era no prédio da igreja deles. Eles estavam se casando no coreto da pracinha do bairro, que era bonita o suficiente. Eles nunca tinham visto um casamento tão cheio na vizinhança. Zé não sabia se estavam ali pelo escândalo ou se era pela situação inusitada de um casamento na praça. Mas todos esses pensamentos, neste momento, estavam bem no fundo da cabeça de Zé. Naquele momento, sua

[série] Dezembro de Deus | Cap. II - Panis et circenses

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Clique aqui para ler o capítulo I.  Julho de 1978 “Se deixo um negro entrar na piscina, cem brancos saem imediatamente”. As palavras de um dos diretores do Clube de Regatas Tietê saíram em um jornal que Zé leu. Com seus 12 anos de idade, o menino pela primeira vez olhou no espelho e viu que sua cor o impediria de entrar num clube, depois que quatro garotos parecidos com ele foram impedidos e provocaram uma comoção. Quando ouviu que dona Marta, sua vizinha, estava indo pra frente do Theatro Municipal protestar em favor dos pretos, Zé queria ir. Mas o pai não deixou. - Não vai não! Você é muito novo pra isso! - João Pedrosa disse com sua voz grave, seu sotaque baiano e sua feição sempre carrancuda - E só tô vendo os macumbeiros irem! Isso não é coisa de crente não - Mas dona Marta tá indo e é da igreja - protestou um frustrado Zé. - Já falei que não vai, Zé! Zé não foi. Mas foi brincar na rua e, pela primeira vez, aceitou o convite de uns garotos da vizinhança para tentarem reproduzir as

[série] Dezembro de Deus || Cap. I - Anunciação

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  Capítulo I - Anunciação Abril de 1984 - Maria de Deus! Eu já te falei pra não sair em dia de manifestação, menina! O que aconteceu com você? O sotaque de Dona Zilá ficava ainda mais forte quando ela estava brava. Deu uns tapas na cabeça da filha pra tirar um pouco do pó branco que cobria seu cabelo curto e crespo. - Nada, mãe, tá tudo bem… - Tá tudo bem nada - disse a senhora, tirando os olhos do cabelo esbranquiçado e olhando bem pras pupilas de Maria, séria - cê foi pra manifestação, foi? - Claro que não, mãe! - Mas tava na cidade? - Eu só passei… Zilá deu mais uns tapas no ombro de Maria. Mas esses foram mais doloridos - Deus não gosta da gente se envolvendo nessas coisas não, Maria! Isso é coisa desse povo de faculdade, onde ficam colocando titica na cabeça de gente rica. - Né titica não, mãe! É direito… Dona Zilá deu um tapão final na orelha da filha. - Pois quando você tiver sua casa, tu vai caçar jeito de ter direito. Enquanto morar debaixo do meu teto, você me obedece, oxe...

Não há cumprimento da Lei de Deus hoje sem combate ao racismo

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Porque, assim como o corpo sem o espírito está morto, assim também a fé sem obras é morta. (Tiago 2:26) A religião pura e imaculada para com Deus e Pai, é esta: Visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações, e guardar-se da corrupção do mundo. (Tiago 1:27) Nos tempos atuais, onde a mentalidade do cidadão comum tem sido muito polarizada, muitos cristãos faltam chamar Jesus e os profetas de esquerda por pregarem o auxílio ao oprimido e o envolvimento em causas (perceba que eu disse causas, não partidos ou ideologias) sociais. Eu já escrevi textos sobre como a igreja é um lugar plural que, para ser igreja, precisa abarcar todo tipo de gente, inclusive gente que pensa de forma oposta. Em tempos como estes, isso é muito difícil, mas necessário. Acontece que a questão de se envolver na causa social está na Bíblia há MUITO tempo, muito antes de existir esquerda, direita, muito antes de Marx e Engels nascerem, muito antes de qualquer termo que utilizamos hoje pra discutir

Mas Jesus pisaria no sambódromo?

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Uma mistura das representações de Cristo que já fiz pro Instagram. Todas incompletas, todas imperfeitas e fragmentadas, como todas as representações existente. Senhor, tenha piedade Olhai para a terra Veja quanta maldade [A Verdade vos fará livre - Samba-Enredo da Magueira, 2020] Passei essa semana lendo textos de cristãos sobre o enredo da Mangueira deste ano - textos de diversas opiniões. Pensei muito se escreveria sobre isso. Primeiro decidi que não, afinal, já fiz postagens sobre a imagem de Cristo diversas vezes no Instagram (@teolonerd). Mas talvez fosse hora de escrever um texto um pouco maior no blog sobre essas abordagens atuais que parecem representar a tantos e ofender a tantos outros. Talvez você chegue ao final do texto e fique frustrado com o que escreverei aqui, portanto, já aviso: este não é um texto de respostas prontas sobre o que a Mangueira fez. É uma reflexão, que gosto de pensar que é baseada na Bíblia, sobre nossa reação como cristãos a isso.