Deus Réu e Culpado



Quando Caifás rasga suas vestes declarando que “O Senhor nosso Deus é um só!” indignado com a declaração de Jesus, estamos presenciando na verdade a cena em que o julgamento clandestino do Nazareno dá seu veredicto: Culpado!
Declarada a culpa, eles o levam para o governador romano que julgará Jesus sob a perspectiva política. Numa jogada aparentemente esperta para escapar de uma rebelião popular, o governador Pilatos, lava suas mãos publicamente depois de confiar que o povo teria o bom senso de escolher o inocente.

Quando pensamos no sacrifício de Jesus como uma entrega para salvar a humanidade, pensamos nos pecados pelos quais ele morreu individualmente, em formato de lista.
E sim, ele morreu por cada pecado cometido no passado, no presente ou no futuro.
Mas a morte de Jesus foi consequência de uma condenação jurídica e religiosa que foi baseada numa acusação consistente.
A justificativa político-judiciária para a morte dele foi por afirmar ser Filho de Deus perante os religiosos escandalizados e por afirmar ser rei perante o rei Herodes e o governador Pilatos.

Se pararmos para pensar nesse fato, percebemos que Jesus morreu inocente – afinal ele realmente é Rei e Deus – por um crime que toda a humanidade comete desde que Eva deu a primeira mordida no fruto.
Mais do que morrer para perdoar nossos atos pecaminosos, Jesus morreu acusado de cometer o pecado que é a raíz de todos os outros: o pecado da separação deliberada de Deus.

Se você ler a Bíblia e se deter apenas na definição de pecado como a transgressão da Lei (que é uma definição mais do que válida), você corre o risco de cair no farisaísmo e de perder algumas outras implicações e definições que a Bíblia dá para pecado. O pecado principal de Eva não foi morder a fruta ou se sentir atraída pela aparência suculenta dela, e sim desejar o que Satanás estava lhe oferecendo. A tentação foi: “Coma do fruto e tereis conhecimento do bem e do mal, então serás como Deus!”
Afinal, se ela podia ser como Deus, por quê confiar na palavra dEle? Para quê ser dependente dEle?
E com essa declaração de independência e pretensão, a humanidade mergulhou na ruína.


As tentativas humanas de controlar a própria vida sem depender de Deus vêm desde então e isso nunca esteve tão atual. No nosso ponto de vista, nós evoluímos do acaso, por nós mesmos, através da adaptação, nós somos capazes de ser bons sem depender de Deus, e somos capazes de desenvolvermos socialmente num Estado secularizado e pretensamente laico. Somos nossos próprios deuses, somos nossos próprios reis.
E essa é a nossa ruína, essa é a causa de todos os males que assaltam a humanidade. Em suma, esse é o pecado que Jesus tomou sobre si para nos salvar da perdição.
Quando caminhamos na direção da autossuficiência e independência de Deus, caminhamos deliberadamente para a morte e a condenação. Mas nos recusamos a aceitar que o nosso pecado seja declarar a nós mesmos responsáveis e governantes das nossas próprias vidas.

Mas Jesus morreu acusado de mentir sobre ser Deus e Rei quando na verdade o era. O inocente pagando o preço de uma acusação que era nossa por lei.
O diálogo de Jesus com Pilatos no Evangelho de João traduz a nossa pequenez diante do Grande Governante, que ao afirmar que seu Reino não era deste Mundo parecia um lunático, mas na verdade estava afirmando que sua autoridade era maior do que a de Pilatos, e que o erro deste era justamente reclamar um poder que não era seu.
Ainda assim, Jesus foi silenciosamente em direção ao seu sacrifício apenas para tomar sobre si as consequências que Adão e Eva semearam para a humanidade e que nós ainda plantamos e colhemos hoje.
Somos bilhões de rebeldes e anarquistas dizendo a nós mesmos que somos donos da nossa própria vida, somos filhos traindo seu pai, súditos traindo seu Rei. Merecemos a morte.
O Rei porém, escolheu morrer sob a acusação do pecado que era nosso, apenas para que pudéssemos ter novamente a escolha de pertencer a quem fomos criados para pertencer. Para sermos novamente quem nós realmente somos.

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