Ateu por Uma Semana

Quando falo que fui ateu por uma semana, as pessoas riem. Alguns pensam que eu estava apenas sendo um adolescente revoltado, outros dizem que estava tentando criar uma desculpa para fazer o que eu quisesse – o que não deixa de ser uma realidade na vida de muitos que negam a Deus, alguns ainda falam que eu estava sendo isso superficialmente.
Eu devia ter meus 16 ou 17 anos. Frequentava e era ativo na igreja desde os dois anos de idade! Quando eu tinha entre 5 e 7 anos, meu pai se batizou, então eu tinha uma família inteiramente cristã.
Eu era uma criança precoce – não muito, apenas ligeiramente precoce – e sempre li muito. Em contrapartida era muito retraído. Praticamente o oposto do que sou hoje.


A minha adolescência foi cercada dos dilemas pessoais pelos quais a maioria passa. A necessidade de afirmação, e principalmente a necessidade de pensar por si mesmo.
Claro que isso acontece de maneira muito diferente com todos, e as consequências também são outras. No meu caso, eu nunca fiz questão de externar o que eu sentia através das atitudes, como muitos fazem e acabam por afirmar o conceito de “adolescente rebelde”. Enquanto conflitos, dúvidas e questionamentos violentos e fundamentais aconteciam dentro de mim, eu era um adolescente quieto, comum, um crente que participava de todas as coisas na igreja.
Quando tive acesso à internet ilimitada (coisa que acabara de se tornar “popular”) conheci um mundo novo. Garoto do interior, uma cidade mediana onde tudo era muito conservador, tanto dentro da igreja como fora dela. Tinha consciência do ateísmo, até tinha conhecimentos teóricos a respeito, mas conhecer pessoas adeptas ao ateísmo – mais do que isso, me tornar amigo delas – me fez pensar se esse pensamento era realmente tão louco e insano assim.
Tinha muitos amigos virtuais e conversava longas horas com todos eles, muitas vezes sobre cristianismo. Entrava em muitas discussões do tipo “ateus x crentes”. Ouvia todo tipo de pessoas com pontos de vista bem diferentes dos meus. Depois disso passei a LER coisas de pessoas que tinham pontos de vista diferentes dos meus. De uma forma lenta comecei a questionar, buscar respostas e pensar. Tive contato com fundamentos do ateísmo, agnosticismo, espiritismo, budismo, dentre outros.
Passei por vários tipos de cristianismo, passei pelo deísmo até chegar ao totalmente descrente. Depois de muito pensar e questionar, de enxergar o lado diferente do que eu enxergava antes, simplesmente decidi que Deus não existia. Claro que meu sentimento em relação às coisas ruins que eu tinha vivido e presenciado, os sofrimentos pelos quais eu havia passado me ajudaram. Mas também foi algo racional. Eu questionei histórica, filosófica e cientificamente a existência de Deus.
Não externei isso pra ninguém. Não precisava e não queria ser visto como um adolescente revoltado. Não falei sobre isso nem mesmo com um grande amigo meu com quem conversava sempre sobre vida espiritual – e quem havia me ajudado muito no meu “processo de questionamento”.
Não houve mudanças externas perceptíveis – como sempre havia lidado com tudo assim – apenas cheguei a essa conclusão e decidi que minha vida dali pra frente mudaria em relação a isso, mas continuaria sendo quem eu era. Isso não mudaria meu caráter ou minhas atitudes.
Isso devia ser o meio de uma semana. No fim de semana fui à igreja e fiz tudo o que eu estava acostumado a fazer. Mas era apenas para não chamar a atenção dos meus pais, para que não me questionassem meu comportamento estranho.
Outra semana se passou. Vivi normalmente, não estudei a Bíblia, não orei, isso não fazia mais sentido pra mim e começava a me soar como loucura. Deus já me parecia um amigo imaginário coletivo. No sábado seguinte meu pai que pregou. Fui a igreja sem nenhum pingo de vontade de ir. A única coisa que eu admirava nos sermões do meu pai é que ele era – nas próprias palavras – “curto e grosso”. Terminava na hora certinha e podíamos ir embora rápido.
Naquele dia ele mencionou rapidamente um incidente de livramento, quando Deus nos salvara de uma maneira “cientificamente inexplicável” de uma explosão de carro.
Então me lembrei. Acabei me lembrando de outro incidente milagroso (que já até escrevi a respeito aqui). E me lembrei de outras experiências.
Mas não foram as experiências milagrosas. Não foi o que chamamos de “sobrenatural” que me fez acreditar de novo. Eu parei pra pensar: “Mas será que tudo o que eu vivi ANTES foi mentira? Será que TODAS as orações, arrepios, momentos inspiradores, amizades, relacionamentos, músicas... Tudo foi uma completa mentira?”
Decidi que não.
Não resolvi ser cristão de novo de uma hora pra outra assim como não tinha decidido de uma hora pra outra ser ateu.  Recomecei tudo.
Recomecei a questionar, buscar. Procurei outras respostas para as contradições que eu via em Deus e na Bíblia. E no final desse segundo processo encontrei a Deus.
Descobri que vivia dois extremos: Deus estava no meu intenso sentimentalismo, mas não se encontrava lá quando resolvi racionalizar tudo.
Eu encontrei Deus no ponto de equilíbrio entre razão e emoção.
Encontrei Deus na ciência, na natureza, no racional, encontrei Deus nos sentimentos, no intangível e no absurdo. Mais do que isso, encontrei Deus ao meu lado.
Descobri que a ciência, a história e a filosofia são muito importantes pra quem procura Deus,os milagres, sentimentos e aceitação do invisível também. Descobri que Deus pede que ofereçamos nosso corpo em sacrifício vivo, que é o nosso culto RACIONAL!
Descobri que por mais que nos sintamos afastados dele, não são os sentimentos que devem prevalecer e sim a consciência da verdade, por mais que as vezes ela pareça mentira.
Hoje eu sei que relativismo em relação a isso é pura desculpa para ignorar que nós NÃO podemos viver de qualquer jeito. Acredito firmemente numa verdade absoluta. Eu sei que questionar é mais do que saudável, principalmente para cristãos, mas sei também que a maioria dos nossos “E se?”  são perigosos e tentadores demais. Muitas vezes nos agarramos neles pensando que eles são nosso porto seguro quando na verdade são navios em processo de inevitável naufrágio. Questionar é saudável, mas é necessário chegar a um ponto. Perguntar  “e se” durante toda a vida muitas vezes deixa de ser um questionamento saudável e torna-se um comportamento doentio e infantil que faz com que a pessoa se afunde em depressão.
Se o homem tivesse sido criado para não questionar, não haveria uma árvore do conhecimento do bem e do mal no jardim do Éden.
Se TODAS as perguntas existissem para serem respondidas, não haveria uma árvore da Vida no Jardim do Éden.

Olhando para essa minha “semana de ateísmo” (e como esse termo soa ridículo) penso que passei por um dos processos mais importantes que devemos passar - o de desligamento das bases alheias para construir a própria. Hoje eu posso dizer com toda a segurança que não sou cristão por causa dos meus pais ou da sociedade. Sou cristão por que eu escolhi. Mais do que isso, escolhi baseando-me em intensa busca pelo conhecimento e não pelas desculpas ou pelo êxtase de encontrar sensações boas.
A sensação de satisfação, os arrepios, as lágrimas, a fé, tudo isso tem a ver com sentimentos e emoções, mas são consequência de uma decisão completamente racional. Deus não deseja apenas seu coração. Ele quer o seu cérebro. Ele quer te mostrar que o que você busca pode não ser o melhor. Ele quer te mostrar que Ele não só existe como vai fazer de tudo pra você enxergá-lo. Até chegar o dia que sua decisão for definitiva. O conhecimento e a consciência de Deus é um processo. Não uma decisão repentina que se resolve no mesmo minuto, é um relacionamento que deve se desenvolver continuamente, e se você o interrompe, corre sérios riscos de se enforcar com um grande e opressor “E SE?”. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Sopro e Fumaça: Avicii se foi, mas deixou um pouco de Eclesiastes em sua música

Religião no Facebook??